Sou fotógrafa mas também adoro um "causo", assim o pretenso desejo de ser escritora dá seus passos com as imagens captadas. Fico grata aos possíveis leitores.
Bem, ainda tenho na geladeira um pouco de geléia mineira conseguida com D. Perpétua.
D. Perpétua é uma ex-moradora da região desapropriada para ser parque nacional, falou-me com saudosismo das terras produtivas próximas ao Cânion das Bandeirinhas.
Quando perguntei se conseguiria ir de ônibus a cidade de Serro e voltar no mesmo dia, ela me aconselhou a ir para Conceição do Mato Dentro, pois seria mais próximo e ainda assim implicaria em um dia de passeio.
Dona Péta, somente para os íntimos, lembrou ainda que nos tempos de menina a viagem para “venda” mais próxima mobilizava o despertar na madrugada, ou seja , a saída de casa às quarto horas da manhã e o retorno às oito da noite.
Esta senhora que era caseira, atendente e cozinheira da pousada em que fiquei, ganhou minha simpatia já no primeiro dia de saída fotográfica.
Disse: “Valéria, cé vai pro parque? Então faz um lachim (e aquela mesa de café mineiro com tudo o que se tem direito sorrindo para mim) purque lá a àgua é limpinha dá pra beber, mais num tem lanchoneti e nada.”
Lá fui eu pro meu primeiro dia, botas de “trekking” inglesas feitas na china.
O tempo era instável, D. Perpétua me garantiu que melhoraria mas o jardineiro, na saída da pousada, me alertou para o perigo das tromba-d’àguas e o risco de ficar ilhada pois haveria rios para atravessar.
Rios? Rios? Como assim? Na portaria do parque novamente fui alertada, considerei um exagero tais conselhos.
Com oxigênio, quase puro nas veias, não me abalei por interira quando um dos solados da bota inglesa feita na china se descolou afetando os planos e roteiros idealizados na noite anterior.
A questão era: seguir com a certeza de que o outro pé também se descolaria e me expor ao riscos de terrenos diversos ou voltar? Decidi seguir. E, a partir dali o terreno só piorou.
O primeiro rio, quase córrego, Rio das Pedras, foi a visão mais bela da manhã até então, fiz vários auto-retratos e me cansei de tanto correr para apertar o temporizador, quando finalmente decidi por um”biquinin” e entrar na água, apareceu um senhor à cavalo. Por medo, inibição ou ambos, logo puxei conversa e fiquei sabendo que se tratava de um funcionário do parque, ele estava vendo as condições da trilha para no dia seguinte acompanhar uma senhora turista.
Tratava-se de uma mulher com sessenta anos, viúva, aposentada e com filhos casados, resolveu rodar pelo Brasil de bicicleta; teria vindo do sul , já conhecera muitos lugares e estava alojada na sede do parque.
O funcionário, após me contar admirado as faças dessa ciclista especial, seguiu em sua missão de reconhecimento e eu segui meu caminho pensando em uma bicicleta e nos meus possíveis sessenta anos, mas na impossibilidade de prever o amanhã e as alegrias e tristezas que movem as ações alheias, me concentrei em apressar o passo para chegar a Cachoeira da Farofa.
Já dentro de um brejo, o outro solado me abandonou, agora a aventura deixava de vez a face romantizada de fotografar a natureza.
O tempo foi se abrindo – Perpétua tinha razão.
As sobras do café foram simplesmente devoradas, cabendo pouco espaço para qualquer avaliação de paladar.
O jardineiro errou quanto ao tempo mas seu alerta para o rio foi tristemente verdadeiro, com água bem acima da cintura, descalça, com equipamento fotográfico e sozinha, decidi que era hora de voltar.
Para chegar ao Canion das Bandeirinhas faltavam uns cinco quilometros, equivalente a mais duas horas de caminhada. A decisão de voltar foi tomada rapidamente, sem nenhum drama, lamentava ter que falar “olha não cheguei lá”, mas ficava muito feliz pela atenção que dava aos meus próprios pés.
No retorno encontrei, em momentos distintos, três casais e um rapaz pela trilha, em todos eles paguei o mico de estar com a bota inglesa feita na china pendurada no meu ombro e a declaração de que: “não, eu não cheguei até a Cachoeira porque o sapato estourou e tinha o rio meio fundo para atravessar com minha máquina”, em compensação as melhores fotos do dia foram na luz do trajeto de volta.
Da portaria do parque até a pousada, cerca de dois quilometros, a estrada era de terra cheia, mais cheia mesmo, de pedrinhas.
Por sorte ou azar, uma moça que estava deixando o expediente naquela hora foi me acompanhando, pois iria para mesma direção. Sorte ou azar? Ela também estava à pé e com pressa para pegar o ônibus para faculdade. Com vergonha segui mancando sem reclamar.
Com pouco menos de cem metros da minha pousada, passou um carro que deu carona para ela, ai pude seguir aquele fim de percurso com toda manha e dor verdadeira, só então percebi como foi útil andar rápido e não parar para reclamar. O prêmio foi o banho de piscina e a sessão de sauna.
A pousada estava vazia. Como única hóspede me deitei para dormir sorrindo, feliz e com os pés literalmente “pipocando”. Agora eu possuia um punhado de imagens e uma boa história mineira pra compartilhar...
Bem, ainda tenho na geladeira um pouco de geléia mineira conseguida com D. Perpétua.
D. Perpétua é uma ex-moradora da região desapropriada para ser parque nacional, falou-me com saudosismo das terras produtivas próximas ao Cânion das Bandeirinhas.
Quando perguntei se conseguiria ir de ônibus a cidade de Serro e voltar no mesmo dia, ela me aconselhou a ir para Conceição do Mato Dentro, pois seria mais próximo e ainda assim implicaria em um dia de passeio.
Dona Péta, somente para os íntimos, lembrou ainda que nos tempos de menina a viagem para “venda” mais próxima mobilizava o despertar na madrugada, ou seja , a saída de casa às quarto horas da manhã e o retorno às oito da noite.
Esta senhora que era caseira, atendente e cozinheira da pousada em que fiquei, ganhou minha simpatia já no primeiro dia de saída fotográfica.
Disse: “Valéria, cé vai pro parque? Então faz um lachim (e aquela mesa de café mineiro com tudo o que se tem direito sorrindo para mim) purque lá a àgua é limpinha dá pra beber, mais num tem lanchoneti e nada.”
Lá fui eu pro meu primeiro dia, botas de “trekking” inglesas feitas na china.
O tempo era instável, D. Perpétua me garantiu que melhoraria mas o jardineiro, na saída da pousada, me alertou para o perigo das tromba-d’àguas e o risco de ficar ilhada pois haveria rios para atravessar.
Rios? Rios? Como assim? Na portaria do parque novamente fui alertada, considerei um exagero tais conselhos.
Com oxigênio, quase puro nas veias, não me abalei por interira quando um dos solados da bota inglesa feita na china se descolou afetando os planos e roteiros idealizados na noite anterior.
A questão era: seguir com a certeza de que o outro pé também se descolaria e me expor ao riscos de terrenos diversos ou voltar? Decidi seguir. E, a partir dali o terreno só piorou.
O primeiro rio, quase córrego, Rio das Pedras, foi a visão mais bela da manhã até então, fiz vários auto-retratos e me cansei de tanto correr para apertar o temporizador, quando finalmente decidi por um”biquinin” e entrar na água, apareceu um senhor à cavalo. Por medo, inibição ou ambos, logo puxei conversa e fiquei sabendo que se tratava de um funcionário do parque, ele estava vendo as condições da trilha para no dia seguinte acompanhar uma senhora turista.
Tratava-se de uma mulher com sessenta anos, viúva, aposentada e com filhos casados, resolveu rodar pelo Brasil de bicicleta; teria vindo do sul , já conhecera muitos lugares e estava alojada na sede do parque.
O funcionário, após me contar admirado as faças dessa ciclista especial, seguiu em sua missão de reconhecimento e eu segui meu caminho pensando em uma bicicleta e nos meus possíveis sessenta anos, mas na impossibilidade de prever o amanhã e as alegrias e tristezas que movem as ações alheias, me concentrei em apressar o passo para chegar a Cachoeira da Farofa.
Já dentro de um brejo, o outro solado me abandonou, agora a aventura deixava de vez a face romantizada de fotografar a natureza.
O tempo foi se abrindo – Perpétua tinha razão.
As sobras do café foram simplesmente devoradas, cabendo pouco espaço para qualquer avaliação de paladar.
O jardineiro errou quanto ao tempo mas seu alerta para o rio foi tristemente verdadeiro, com água bem acima da cintura, descalça, com equipamento fotográfico e sozinha, decidi que era hora de voltar.
Para chegar ao Canion das Bandeirinhas faltavam uns cinco quilometros, equivalente a mais duas horas de caminhada. A decisão de voltar foi tomada rapidamente, sem nenhum drama, lamentava ter que falar “olha não cheguei lá”, mas ficava muito feliz pela atenção que dava aos meus próprios pés.
No retorno encontrei, em momentos distintos, três casais e um rapaz pela trilha, em todos eles paguei o mico de estar com a bota inglesa feita na china pendurada no meu ombro e a declaração de que: “não, eu não cheguei até a Cachoeira porque o sapato estourou e tinha o rio meio fundo para atravessar com minha máquina”, em compensação as melhores fotos do dia foram na luz do trajeto de volta.
Da portaria do parque até a pousada, cerca de dois quilometros, a estrada era de terra cheia, mais cheia mesmo, de pedrinhas.
Por sorte ou azar, uma moça que estava deixando o expediente naquela hora foi me acompanhando, pois iria para mesma direção. Sorte ou azar? Ela também estava à pé e com pressa para pegar o ônibus para faculdade. Com vergonha segui mancando sem reclamar.
Com pouco menos de cem metros da minha pousada, passou um carro que deu carona para ela, ai pude seguir aquele fim de percurso com toda manha e dor verdadeira, só então percebi como foi útil andar rápido e não parar para reclamar. O prêmio foi o banho de piscina e a sessão de sauna.
A pousada estava vazia. Como única hóspede me deitei para dormir sorrindo, feliz e com os pés literalmente “pipocando”. Agora eu possuia um punhado de imagens e uma boa história mineira pra compartilhar...
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